Estou morando em Paris desde o último sábado e tenho passado bastante tempo refletindo sobre o sentido do estranhamento e da desnaturalização. Para começo de conversa eu estou morando sozinha, conheço poucas pessoas (na verdade 3 que são brasileiras e que moram na França e 1 que é da Tunísia e mora em Paris) e quase não falo nada de francês. Esses três elementos já contribuem sobremaneira para ter uma vida bem complexa nessas terras nórdicas. Voltando ao estranhamento... nessa primeira semana além de tentar resolver as coisas práticas do cotidiano também me deixei relaxar e fiz um pouco de turismo e é sobre as minhas impressões que esse texto irá tratar.
Durante as tentativas de resolução de questões burocráticas da vida cotidiana algumas coisas me chamaram atenção. A primeira delas foi a não servidão que os franceses estão acostumados. Vou me explicar: aqui tudo é automatizado e você faz tudo sozinho. Um exemplo: colocar uma carta no correio. No Brasil a pessoa entraria em uma fila, um atendente iria perguntar o que a pessoa queria e ela entregaria a carta ou o que fosse a ele e seguiria sua vida. Na França, ou pelo menos em Paris, no Correios, Le Poste, existem uma série de máquinas que imprimem o selo, trocam o dinheiro e o indivíduo tem que ir já sabendo o que e para onde ele irá enviar suas correspondências. Ao lado de fora tem várias caixas com etiquetas como “etranger”, “carte priorité”, “carte simple” e assim por diante. Você faz tudo sozinho. E isso se reproduz em outros locais como na xerox, no mercado, no restaurante e também nas atividades domésticas. Essa idéia de que existe uma pessoa que cuidará de suas coisas e limpará a sua sujeira é bem dos países de herança escravagista, como o nosso, por exemplo.
Outra coisa que me encanta é a quantidade de equipamentos de cultura e lazer que os franceses têm à disposição e que eles utilizam de fato. Fui hoje à biblioteca pública do meu bairro e fiquei impressionada com o acervo de livros, CDs, DVDs, revistas que existe e que pode ser emprestado a quem tem o cartão da biblioteca. Tem desde histórias infantis aos clássicos da sociologia e da filosofia. Além disso, a internet é liberada. O local é cheio e silencioso. Fiquei impressionadíssima. A quantidade de livrarias e o preço dos livros são coisas que também aguçam a minha curiosidade. Os livros são bem baratos e existem várias editoras pequenas que os fazem com materiais mais simples para que possam ser comercializados a baixo custo.
Parque e praças estão por toda parte. Todos possuem internet de graça (um acordo entre a prefeitura e uma operadora) e sempre estão com muita gente, geralmente crianças e adolescentes, brincando, conversando ou simplesmente descansando. Como ainda é verão, os dias são mais longos e as pessoas aproveitam para ficar mais tempo nesses espaços públicos. Soube que isso se torna impossível a partir de outubro.
Em relação aos locais de turismo a coisa muda um pouco de figura. Como todo lugar turístico, é sempre cheio e bastante caro mas faz parte do negócio. Falando nisso, todas ou quase todas, as lojas de bugingangas pertencem aos coreanos. Por outro lado, tudo é sinalizado. As ruas têm placas e existem vários mapas da cidade por todos os lados. Mesmo se a pessoa se perder (como eu em vários momentos) é só ir a um ponto de ônibus e, voilá, tem um mapa a sua disposição. Claro que o metro é um caso à parte. Já foi mais do que falado como o sistema é eficiente, e é mesmo, mas é muito grande e cheio de entroncamentos, logo, tem que ficar ligado senão é muito simples de se perder.
Ainda não fui feliz com a comida. Embora digam que é maravilhoso e tal minha experiência não foi a das melhores. Acho que por conta da língua. Eles não entendem o que eu falo e não tem a menor pretensão nem paciência de explicar o que está no cardápio, logo, ou você pede logo, paga e come ou vai embora do restaurante. A cerveja é boa, é cara mas é boa e é servida em copos de meio litro, salvo engano, porém para beber bem e barato tem que ir ao outro lado da cidade como em Montmartre e Belleville. Aliás Montmartre é um caso a parte, tem uma igreja no alto a Sacre-Coer mas embaixo só tem sexy-shop e putaria.
Por ora são as minhas impressões. Certamente estou ainda com um olhar ingênuo sobre a cidade mas estou certa que a visão crítica virá com o tempo. E, claro, estou adorando essa experiência!